domingo, 28 de março de 2010

Traição, hipocrisia e o povo brasileiro

Em um domingo desses, eu estava jogado na cama curtindo uma enxaqueca que só quem tem sabe como é. Em meio ao tédio vespertino, fiquei vendo TV, sem muita animação com a programação oferecida pelos canais abertos, até que me chamou a atenção uma entrevista com um rapaz recém-saído de um reality show. O ponto em questão era a infidelidade amorosa que o moço praticou enquanto estava no programa.

Alheado do mundo externo, mesmo tendo uma namorada, acabou se engraçando com uma colega de programa e tiveram um caso para o Brasil inteiro assistir. A moça traída deu um depoimento alegando as dores da traição. Não faltou quem se solidarizasse com a ex-namorada (é claro que a essas alturas não havia mais o namoro) e apontasse o indicador contra o rapaz. Um crápula, aliás, aos olhos dos moralistas palpiteiros da vida alheia.

O assunto me interessou muito menos pelo programa em si, que pela hipocrisia generalizada e pelo juízo imediato que se fez da situação. Regra básica da justiça é que ambas as partes sejam ouvidas. Não sei como estava a relação entre eles antes do programa e menos ainda sei o que se passou dentro do rapaz enquanto esteve no programa.

O único fato concreto é que havia um relacionamento anterior, que não tinha acabado, e que houve algo com outra mulher. Houve, enfim, uma terceira pessoa. E daí? E daí que se formos analisar, vai ser muito pouco raro encontrar quem não teve um relacionamento incidental enquanto um namoro estava às vésperas do fim. Mesmo os paladinos da moralidade que apontaram o dedo contra o rapaz, por certo, já tiveram essa experiência. Em relacionamentos, quem vê de fora, vê sob uma ótica muitas vezes embaçada.

A despeito do mau gosto do programa, a despeito das situações forçadas, a despeito de os participantes muitas vezes parecerem ratinhos de laboratório colocados sob condições pré-determinadas para experimentos psicológicos e construções de “barracos” pré-armados, foi interessante ver a reação das pessoas off reality show. Se estivessem naquela condição, tantos que acusaram teriam feito atos semelhantes. Talvez até tenha feito o mesmo longe das câmaras. Talvez tenham sido até piores.

Em conversa com o Lilo, ele me disse algo que cabe aqui. Mutatis mutandi, ele disse que, se fizermos uma pesquisa questionando se as pessoas gostam de ver atropelados ensaguentados sob o asfalto, ninguém dirá que gosta, mas quando veem um acidente pelas ruas, quase todos param para assistir a cena estrebuchante.

Como dizia o meu mestre Carlão, “na prática, a teoria é outra”. É isso.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Luz e Escuridão

Quando eu era pequeno acreditava que quanto mais conhecimento se obtivesse, melhor se entenderia o mundo e as pessoas. Acreditava que, sabendo o que era bom, ele seria praticado. Era um socrático sem fazer ideia dessa situação.

O tempo passou e hoje eu tenho a impressão invertida: quanto mais se sabe, menos se entende o mundo e as pessoas. Quanto mais se descobre sobre as coisas, mais aprendemos que não é possível entender, de fato, as pessoas e o mundo. O conhecimento é o mergulho na consciência de que, por mais que se saiba, ainda resta muito mais para aprender. E ficamos sozinhos, na escuridão, no limbo, entre a plena ignorância e a expectativa de sabedoria.

O conhecimento é isto: um mergulho na escuridão.

Por outro lado, a ignorância, o desconhecimento, é um caminho de luz, onde tudo faz sentido e onde as coisas simplesmente são como são, onde as pessoas são como são. Nada além.

A relação cartesiana entre o conhecimento e a compreensão do mundo e das pessoas é inversamente proporcional: quanto menos se sabe, mais se tem a impressão de compreender.

Quanto mais sabemos, mas temos a certeza que ainda pouco sabemos (isso também é socrático) e torna-se imperioso buscar mais saber, mais conhecimento para aplacar a insatisfação desse pouco saber.

Quanto menos sabemos das coisas, mais simples é que tenhamos certezas. Sobretudo certezas absolutas. As certezas deixam o mundo claro e nos permite enxergar aquilo que é o óbvio para todos.

Cada uma das vezes que eu sinto ter certeza sobre algo, acende dentro de mim a luz da ignorância, que deixa tudo simples e claro.