domingo, 12 de junho de 2011

Sentimentos datados

Tenho a sempre impressão que as pessoas não sabem como sentir e menos ainda sabem expressar o que sentem. Aliás, não sabemos mais nada. Somos uma sociedade guiada pelas vontades de alguns e vivemos sob o signo do pré-determinado. Ouve-se aquilo que alguém entende que todos devem ouvir. Veste-se aquilo que a indústria diz que todos devem vestir. Cada dia existe menos espaço para o individual e tudo é uniformizado.

E a uniformização cria até mesmo “temporadas do sentimento”. No Natal, todos se enchem de um sentimento de compaixão (esquecido pelo resto do ano). Dia das mães, dos pais, recém-inventado dia da avó (como se ela não fosse mãe), dias, datas, motivos de se presentear o homenageado. A evidente motivação comercial da data é esquecida e os homenageados são esquecidos pelo resto do ano, normalmente.

Hoje é dia dos namorados. Casais lotam a cidade, de mãos dadas em jantares, cinemas, passeios. O clima de amor invade a cidade, o estado, o país. Flores são distribuídas com bombons, perfumes e presentes diversos. Todo um ritual pré-estabelecido e ditado para uma data específica, onde há demonstração anuais de um carinho que deveria ser diário. Amanhã a vida terá voltado ao normal e o sentimento ostensivo de paixão demonstrado hoje ficará guardado por outros doze meses, para ser exposto no próximo ano.

Concordo com o Benedetti (A Trégua) e somo na luta contra o sentimento datado, com dia e hora marcados. Ainda que me critiquem por não celebrar essas datas, me recuso a seguir o padrão e entrar nesse sentimento determinado por interesses mais industriais que humanos. Quero me apaixonar no natal, sentir compaixão durante o carnaval, fazer folia no dia dos namorados. Quero celebrar meus sentimentos sem hora marcada, quero a espontaneidade do sentir, sem datas, sem prazo.