sábado, 12 de janeiro de 2008

Saudade(s)

Existe um fenômeno lingüístico chamado “idiotismo”, que é uma construção própria de uma determinada língua, uma locução própria. Temos diversos exemplos disso, mas o que mais chama a atenção (a minha, ao menos) é uma palavra que, segundo alguns, não é o melhor caso, haja vista haver algo que se assemelha, salvo engano, no espanhol. A palavra em questão é “saudade”.

Saudade é um sentimento melancólico de coisas ou pessoas que estão distantes ou já se foram. Aquela dor que espezinha, que nos deixa com os olhos voltados para o passado, relembrando fatos, palavras, situações. Aquele sentimento que nos deixa com um meio sorriso no rosto e, não raramente, com os olhos marejados. Não chega a ser uma angústia, mas é muito mais que a simples lembrança.

Uma amiga muito querida me corrigiu certa vez por eu ter o hábito de usar a palavra no plural, alegando que a língua não admite o “s” ao final. Preocupado, fui me socorrer dos dicionaristas, que, certamente tendo os mesmos sentimentos que eu, entenderam que é tanta saudade que não cabe apenas o singular para a palavra, admitindo o plural.

Saudade. Saudades. No singular, sentimento melancólico por quem se foi. No plural, lembranças afetuosas a pessoas ausentes. Mutatis mutandi, ficam seis por meia dúzia. No final as pessoas não estão próximas e o sentimento aperta o peito e molham-se os olhos, inevitavelmente.

O certo é que, como dizia o poeta:

“Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.[...]”
(Vinícius de Moraes – Poema de Natal)

Eu sinto saudade. Eu sinto saudades.