quinta-feira, 28 de novembro de 2019

Narciso

Depois de um longo período, resolvi postar aqui novamente. 
Bem, recebi um convite para fazer umas falas para uma rádio. Textos curtos de cerca de 2 minutos. Este abaixo foi o primeiro deles. Caso alguém leia, será um prazer compartilhar.
Abraços.



Oi, meu nome é Xisto Bueno e estarei periodicamente aqui com vocês, conversando um pouco sobre política, economia, agronegócio, futebol e filosofia de boteco. Como este é nosso primeiro contato, vamos começar com a filosofia de boteco. Em verdade quero falar de um mito grego: Narciso. Resumidamente, Narciso era alguém que se achava muito bonito, vivia admirando seu próprio reflexo nas águas até que se apaixonou por si mesmo e acabou morrendo afogado. Parece uma história idiota, mas serve para nosso bate-papo de abertura.
Esse mito grego conta por meio dessa alegoria o modo como nos apaixonamos por nós mesmos, por aquilo que gostamos, pelas nossas ideias. E em regra nos reconhecemos em quem gosta daquilo que gostamos, que tem ideias que se aproximam das nossas ideias (tem bom gosto quem tem o gosto igual ao nosso). E, por outro lado, desgostamos – e até combatemos – quem não gosta daquilo que gostamos, quem tem ideias que contrastam com as nossas. Como diz uma famosa música de nossa MPB, “Narciso acha feio o que não é espelho”.
E com esse modo de ser e agir, aumentado em grau exponencial por mídias sociais, a modernidade tem se mostrado absurdamente intolerante. A experiência do outro só é aceita se nos enxergarmos nele. Nós nos tornamos seres altamente narcisísticos: apaixonados por nós mesmos, incapazes de ter olhos para o que é diverso de nós mesmos. Estamos nos afogando em nós mesmos. Cada um de nós está ensimesmado, certos em absoluto que temos a verdade, sendo que a verdade é aquilo que temos. E só o que temos.
Lembra da velha máxima de que os opostos se atraem? Atualmente os opostos se abatem. Perdemos a capacidade do bom debate, perdemos o processo dialético, perdemos até mesmo a boa educação. E o que veio no lugar? Veio intolerância, veio agressividade, veio o combate. Aparentemente, meus amigos, o mundo contemporâneo vem se marcando por um processo de involução e estamos retrocedendo à condição de bárbaros. 
Fica a reflexão. Um grande abraço e até a próxima.

domingo, 3 de agosto de 2014

Tratado sobre nada

Sempre fui um pensador. Não um pensador no sentido de alguém que se propõe a formalizar um sistema de entendimento do mundo, ou quem se propõe a fazer tratados sobre temas. Mas apenas pensar, formar grandes considerações absurdas sobre coisas sem importância, ou considerações sem importância sobre coisas absurdas, ou até mesmo promover entendimentos contraditórios sobre o cotidiano e sobre tudo aquilo que eu conheço pouco, mas que todos falam muito.
Refleti um sem pares de vezes sobre a condição humana, e sempre cheguei às conclusões repetidas de que nada vale à pena (independente do tamanho da alma, Pessoa). Mas então, o que fazer nesse mundo onde não se vale à pena estar, mas onde viemos parar sem convite e sem aviso? Se há algo onde reside algum sentido – e, ainda assim talvez – são as letras. Nas letras é possível reescrever o mundo de forma que o contexto tenha algum significado e onde é possível desdenhar do que tradicionalmente se usou chamar de real e redefinir o azul como sendo verde, amanhecer pela noite e nunca enterrar as cinzas no carnaval.
A existência é absurda demais para ser levada a sério. E, pior, tenho levado sempre tudo a sério em excesso. Nunca aprendi de outro jeito e fui enganado em minha formação sobre a seriedade das coisas e das pessoas e dos fatos. Pregaram-me uma peça e nunca soube como me desvencilhar disso. E desde sempre estou formulando conceitos mágicos de situações hipotéticas de um mundo de fantasia que aprendi a conhecer, mas onde as pessoas não moram.
A vida é outra coisa, o mundo é outra coisa, a existência é outra coisa. Por isso volto-me às letras. Por isso mantenho-me fazendo conjecturas de tudo que há, sem que nada seja relevante.
Assim, calculo as vagas das ondas, tentando prever a arrebentação. Por isso concentro no tempo verbal colocado de forma não usual, mas que fica esteticamente mais simpático em uma frase e reflito sobre onde colocar uma vírgula. E também mantenho o verso sem ritmo, sem rima e sem sentido, para me divertir imaginando como alguém irá fazer a análise, encontrando motivos onde não houve e encontrando sentido onde não tem.
E escrevo por escrever, para aliviar a alma, para amenizar a angústia. E escrevo pouco, porque o que penso não tem forma e se esvai com o vento. Longos debates tratados comigo mesmo ficam apenas no campo do imaginário, cheio de contrapontos onde eu me refuto e me mostro irrefutável. Sempre fui meu mais ácido crítico.
Mas do pouco que resta escrito, algo encontra publicação virtual. Sem papel, sem edição e (talvez) sem quem leia. E a internet nos recebe, eu e aquilo que me ocorre. Assim, vou me confessando, me inventando, reinventando e tentando encontrar um fim para a minha história, que não chegou ao fim e que mais busco entender que redigir, sendo um eterno refém de meus pensamentos, formulando considerações absurdas. Mas é tudo sem importância.

domingo, 6 de julho de 2014

Traduttore, traditore

Toda tradução é um crime. Salvo textos meramente técnicos, frios e chatos, toda tradução é criminosa. Aliás, não existe tradução, o que existe é uma recriação, uma reexpressão, tentando redizer o que se disse, mas raramente o que se quis dizer (ou será o contrário?). Existe, em cada língua, algo que é só dela. Sons, ritmo, trocadilhos. Coisas da língua.
E quando é poesia, então? Poesia é quase pintura. Aliás, é pintura com sons. Os fonemas tem cores. E é como escultura. Os fonemas tem densidade. Se duvidar, tem sabor. Por isso umas poesias deixam a gente com gosto acre na boca seca. Como se traduz um sabor?
Mesmo assim, como conhecer ao mesmo tempo Dante, Goethe, Rimbaud, Dostoievski e Fitzgerald, sem os tradutores?
Esse processo de recriação depende do olho de quem vê e daquilo que traz consigo. As traduções do Corvo, do Poe, são tão diversas quanto a época e o autor que o resolveu aportuguesar. Dostoievski era conhecido pelas (re)traduções que o autor russo tinha em francês. Direto do russo é outro autor, com outro ritmo.
Tenho a convicção que nunca li um autor estrangeiro, sempre leio o que tradutor quis me dizer dele. Sorte a minha que existe quem se dedica a trair o autor, extraindo de si aquilo que pôde sentir no texto, para que eu possa ter, ao menos, o direito de sentir.
Se acaso eu ler o original e descobrir que não é nada daquilo que o tradutor me contou, vou ter o privilégio de poder saber da traição e saber que provando do mesmo prato, não sentimos o mesmo gosto.

terça-feira, 24 de junho de 2014

Lúcia McCartney

De Rubem Fonseca, tudo o que eu me recordava de ter lido era “A Grande Arte”, e iria passar naquele dia um “caso especial”, na Globo, sobre um seu conto chamado “Lúcia McCartney”. A Fernanda (Torres) faria o papel da Lúcia (McCartney). O Taumaturgo (Ferreira) faria o José Roberto. Até então, pouco me dizia tudo aquilo. Foi então que vi o especial e fiquei encantado.
O modo como o diretor (Roberto Talma) conduziu a trama me fez colar no sofá e não piscar nem por um segundo. O drama emocional da moça, uma jovem prostituta que se apaixona por um cliente, mais velho, misterioso, aparentemente solitário, vai nos ganhando a cada instante. O modo como ele não se deixa envolver, mesmo envolvido. O modo como ela se permite envolver, mesmo não querendo.
Muitos e muitos anos depois, calhou de eu pegar pra ler um livro de contos do Rubem Fonseca. Obviamente, o conto que dá nome ao livro é Lúcia McCartney. Revivi aquela noite de 1994, mas então por escrito, sem uma adaptação, mas no texto original. Confesso que não enxerguei nem a Fernanda nem o Taumaturgo nos personagens, mas continuei envolvido na história pelo modo como o Rubem vai contando e narrando, pela voz e pelo pensamento da Lúcia. Toda a expectativa, toda a dor, todo o desespero.
Acho que todo mundo já teve seus momentos de Lúcia, apaixonando-se por alguém que não se permitiu ficar. Escreveu diálogos mentalmente, que nunca aconteceram. Redigiu cartas que nunca foram entregues. Sofreu, afinal. E todos tivemos momentos de José Roberto, com sentimentos perdidos em um mundo confuso, mantendo-se solitário, e mesmo enxergando uma grande paixão que se apresentava, preferiu ir-se. Não por covardia, não por medo. Mas apenas por conta do fluxo da vida. Às vezes viver é apenas não poder ficar, não poder sentir, não poder ser. Depois, resta pensar no que poderia ter sido. Mas aí, já é tarde, já passou...

quarta-feira, 28 de maio de 2014

A pátria sem chuteiras

1986, Brasil no México. Telê no comando, Seleção Brasileira favoritíssima. Zico, Sócrates, Falcão e companhia. Não poderia dar errado. País inteiro enfeitado de verde e amarelo. Aquele sentimento tradicional em que o Brasil entrava em campo com a seleção. Brasil e França, quartas-de-final. Aniversário do meu irmão. Casa enfeitada para a festa e para a comemoração da ida para as semi-finais. Não poderia dar errado!
Mas deu... Michel Platini comandou o time francês e impediu a plena alegria na hora dos parabéns. A casa e o bolo em verde-amarelo, meu irmão vestido com o uniforme da seleção poderiam ser apenas uma imagem melancólica e triste da derrota, mas representava um sentimento nacional de que, mesmo tendo sido derrotados, acreditávamos na Seleção e o sonho do tetra tinha sido apenas adiado.
Agora a Copa é em casa e o país vive um momento de extrema apatia com o mundial. Não existem carros com a bandeira do Brasil, nem ruas pintadas, nem bandeirolas, nem nada. O povo anda tão desinteressado com a Copa que a escalação do Luverdense causa mais frisson que a da Seleção. A alegria foi convertida em indignação. Existe quase que um sentimento de vergonha geral por conta das obras inacabadas e uma revolta ostensiva com os gastos com as arenas por todo o país. Cartazes de apoio à seleção deram lugar aos que dizem que não vai ter Copa.
Este cenário inimaginável faz pensar no que escreveria Nelson Rodrigues. O Brasil não calçou as chuteiras?
Quando houve a ampla comemoração com o anúncio do Brasil-sede, era conhecida a necessidade de adaptações, havia a promessa de uma significativa melhoria em nossa cidade. Rede urbana, hoteleira, turística. O tal “legado” da Copa. O povo, no início, até entendeu os buracos, desvios e congestionamentos. Mas o tempo foi passando e a paciência acabando.
Obras paralisadas por ações judiciais, uso político do Judiciário para desgastar o Executivo, erros de execução pelos empreiteiros, problemas sociais com desapropriações, atrasos generalizados, valores estratosféricos, chuvas fora de hora, greves, manifestações. Parece que tudo vem conspirando contra o brilho que poderia ter o mundial em país que se intitula “do futebol”.
Estamos a uns dias do início da Copa e já não dá para fazer muita coisa, salvo torcer. Se não pela seleção, ao menos para que a vergonha seja pequena.
Se lá em 1986 mesmo perdendo saímos do mundial de cabeça erguida (oh, Zico... aquele pênalti deve te causar pesadelos até hoje!), desta vez estamos entrado de cabeça baixa. Sem bandeiras agitando nos carros, sem faixas nas ruas. Se em 1986 o Joel Bats fez ficar preso o grito de gol (Zico, juro, não é perseguição), hoje gritam nas ruas que não querem gol.
E se alguém disser que as dezenas (que eram centenas e ano passado chegaram aos milhares) de manifestantes não representam o sentimento de toda a população, que nos digam, então, onde está o vírus da Copa, que este ano não infectou ninguém. Talvez as obras tenham sido uma espécie de vacina, que nos fez criar ao longo dos meses uma certa resistência ao mundial. O desgosto cotidiano foi minando a alegria de ver a Seleção Canarinho.
Mas, mesmo sem a alegoria tradicional pelas cidades, as arenas estarão lotadas quando a bola rolar. Talvez estejam faltando uns bons gols para nos levantar a cabeça, soltar o grito e, finalmente, voltarmos a ser a torcida brasileira.

sábado, 1 de fevereiro de 2014

Tão Perto do Céu

Alguém inventou uma brincadeira muito agradável em uma rede social. Consiste em listar 10 livros que, por algum motivo, marcaram sua vida. Resolvi participar! O primeríssimo livro que me veio à mente foi “Tão Perto do Céu”, da Teresa Noronha. Li quando tinha, sei lá, uns 10 anos. Conta a história de Davi, um menino órfão que, ainda bebê, foi adotado pelo casal Octávio e Mariana. O casal tinha filhos que cresceram e, ainda se sentindo jovens, conheceram o menininho no orfanato (levados pelo Doutor Soares), encantaram-se com ele e o levaram pra casa. O livro é escrito pelos personagens. Cada um dos capítulos é narrado por algum deles. Até duas gêmeas, que sequer falar sabem, tem sua narrativa garantida na história.

A leitura é deliciosa e fala de companheirismo, amizade, amor, honestidade, tudo em meio às aventuras do Davi, que tinha mais ou menos a minha idade quando li. Houve uma certa cumplicidade entre mim e o personagem e, nossa, devo ter lido Tão Perto do Céu umas tantas vezes que quase se gastaram as letras!

Dali, tive o comichão pela leitura. Caramba, aprendi que eu poderia viver outras vidas, participar de aventuras, conhecer outros lugares, entrar na mente das pessoas, conversar com páginas, me emocionar, me irritar e rir à vontade em um universo de tinta e papel. Os livros deixaram de ser a obrigação da tarefa, da sala de aula. Passaram a ser amigos, confidentes. Passaram a dividir comigo as angústias e alegrias deles. Eu passei a enxergar neles muitas das minhas angústias e alegrias.


Quase 30 anos e milhares de páginas depois, a leitura ainda é minha companheira e companhia. Obrigado, Dona Teresa, por ter me ensinado a ver o mundo pintado com as cores das letras.

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Frederico

A grama tem cheiro de liberdade. A dureza do concreto das calçadas e o calor do asfalto tem algo de repressivo. A umidade da noite presente na grama amanhecida, ainda cedo, antes de o Sol forte, é a materialização da liberdade perdida na impermeabilização de asfaltos e calçadas. E Frederico sabe disso muito bem.
O passeio matinal, cuja farra consiste em se lembrar presente pelos odores do dia anterior, marcar sua presença por onde passa e dar umas corridinhas de leve, só pra cansar um pouco, é festejado com o refestelar pelo gramado, deitado de costas e sentindo cada vértebra em contato. A grama úmida, a terra molhada, o frescor.
Normalmente Frederico levava Nadir para passear nas calçadas, cuidando para que tudo transcorresse em segurança. Nunca atravessava as ruas. Guiava Nadir pelo quarteirão, apenas. Mas tudo é uma prisão e as calçadas eram só a continuação da vida engaiolada no apartamento. A grama foi a redenção. Nadir acompanhou e gostou da novidade.
Desde então, Frederico conduz Nadir com cuidado. Saem do apartamento, chegando à calçada seguem pela esquerda, vão até o fim do quarteirão, atravessam a rua, caminham na calçada do outro lado, mais um quarteirão pela direita, um pouco mais em frente e chega na praça. Todos os dias, bem cedinho, antes do trabalho. Grama úmida, dia fresco, liberdade à solta e Frederico com uma indisfarçável alegria que sempre emenda, ao fim do passeio, com a certeza da volta no dia seguinte.

domingo, 10 de março de 2013

Marla se foi...


Estava ainda no trabalho quando chegou a notícia de que o Chávez tinha morrido e as redes sociais já tinham sido inundadas por demonstrações de amor e ódio ao caudilho. (caudilho?). Nunca vou entender nenhuma das duas coisas. Acho que já não sou mais tão jovem para sustentar as bandeiras do idealismo, nem de um lado, nem do outro (muito embora nunca estarei tão velho para fugir do debate – qualquer debate).

Em meio ao falatório, homenagens e críticas, lembrei que havia uma pequena enferma em casa (talvez fosse até um tumor, mas sem tratamento em Cuba – aliás, nenhum tratamento, pra ser sincero) e já era hora de voltar para casa, que trabalho é bom, mas ir pra casa também é!

Chegando em casa, abri a porta e fui direto ao aquário, onde há uns bons dias uma certa peixinha andava triste, com as escamas perdendo o brilho e ficando inchada. Quando a vi pela última vez, na hora do almoço, ela não estava nada bem. A Marla, que, brincávamos, era um peixe que se achava cachorro, dado o alvoroço que fazia quando alguém chegava perto do aquário, praticamente querendo brincar, estava amuada, sem ânimo.

Assim que olhei para o aquário, a cena doeu. A peixinha depositada no fundo do aquário. Desbotada, imóvel. Minha filha, que estava no sofá, ainda não tinha se apercebido que a Marla já não vivia. Disse que, quando chegou, ainda a viu, que fez um ímpeto de ânimo, com uma nadadela efusiva e breve. Provavelmente uma despedida.

Um sentimento de imensa tristeza tomou a casa. Desde então, ficamos com um morador a menos. Deixou-se de ter, de uma vez por todas, os animados balés e rodopios dentro do aquário, os saltos para pegar comida, a saudação matinal, dançando ao nos ver.

A Venezuela perdeu seu controverso líder, mas aqui em casa nossas dores foram pela Marla.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Quid est Veritas?

Conta a Bíblia que a frase emprestada como título deste post foi dita por Pôncio Pilatos, questionando Jesus sobre “o que é a verdade”. Ao que consta do texto original, o romano não aguardou pela resposta e foi embora.

A impaciência de Pilatos deixou o povo ocidental sem uma resposta do bíblico filho do Deus judeu acerca desse conceito. Então, o que é a verdade? Aliás, existe a verdade?

O conceito é tão aberto e confuso quanto “direito”, “amor”, “felicidade”. Em termos científicos, verdade talvez possa ser definido com um experimento testado e aprovado. Algo devidamente confirmado. A ciência e todos os ramos do conhecimento já tiveram “verdades” que deixaram de ser.

Talvez as verdades sejam todas provisórias. Tudo é verdadeiro até que seja provado o contrário. As coisas, assim, serão tão verdadeiras quanto se creiam nelas. Verdades da infância são verdades absolutas. Quanto menos se conhece, quanto menos se questiona, mais verdadeiras são as coisas.

Talvez seja a verdade um estado mental, individual e intransferível. Emprestável, talvez, quando se compartilha uma verdade, mas que é absorvida e interpretada de um modo sempre um pouco diverso daquele originário.

Imagino que Pilatos deu as costas antes da resposta de Jesus para que não se decepcionasse. Verdade não é um conceito universal, é uma experiência individual e provisória, que às vezes vem nua e crua. E também é um tanto indigesta, quando nos empurram goela a baixo verdades estrangeiras, tão fantásticas e míticas quanto a religião dos outros.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Vale a pena

Quando tinha 30 anos tive um "affair" com uma moça de 17. Ainda que eu achasse ela nova demais pra mim (menos pela diferença que pela idade dela em si), ainda que dissesse que ela devesse se relacionar com alguém da idade e geração dela, sempre me contradizia, alegando que alma não tem idade. Deixei-me (confortavelmente) ser convencido.

Não chega a ser surpresa dizer que pouco durou e que me sobraram umas dores ao final do período.

É claro que temos um sem-fim de histórias com outro final, mas acredito que quando a diferença de idade provoca um "choque de gerações" fica inevitável que um dos lados se sinta desconfortável.

E é no desconforto que nos igualamos. Aquele sentimento de peito apertado, sob um desespero leve e mascarado (pânico completo, para alguns), nos coloca todos no mesmo barco. E em seu novo disco, o Chico (Buarque) se confessa tripulação.

Ver tremeluzir o vestido dela através da fogueira, vê-la sumir (ao menos o vulto) entre mil abadás, o coloca em situação passiva perante a juventude da moça. Aliás, o tempo dela que sobra.

Quanto a ele, fica o temor que não dure muito a "novela" (mas ela o faz tão feliz...), de saber que seu tempo está se esvaindo. O argumento da juventude, nessas horas, parece um imperativo categórico.

O que resta? Ir vivendo... O blues, Chico, sempre valerá a pena!



Assistam:
Essa Pequena
Tipo um Baião